O blog da Revista Graciliano, publicação cultural editada pela Imprensa Oficial do Estado de Alagoas, em seu quinto ano de existência e com novo visual, “já tratou dos mais diferentes temas, sempre com um olhar contemporâneo e o compromisso de, a cada edição, levar informação e estímulo à reflexão“.
Uma de suas publicações foi sobre diabolô, num texto com as impressões de leitura de Elayne Pontual, estudante de Comunicação Social da UFAL e estagiária na Editora da Imprensa Oficial Graciliano Ramos.
Aqui, suas impressões:

Diabolô é um antigo brinquedo chinês que, da união de duas semiesferas invertidas, corda e dois bastões, é possível fazer várias manobras. A ideia de equilíbrio e as possibilidades de movimentos levaram o ator, professor e escritor alagoano Nilton Resende a intitular seu primeiro livro de contos com o nome do objeto lúdico.
Dentro das 115 páginas de Diabolô (Edufal, R$ 25), quem protagoniza e narra o primeiro conto, A ceia, é um adulto que mastiga as lembranças das crueldades que atentou contra o avô na infância. Entre um movimento e outro, o menino desvencilha-se do castigo, ignorando as consequências e o senso, completamente ausente, de justiça. No texto, a criança de índole ferina assemelha-se às mãos que controlam as duas semiesferas – uma seria a mãe e a outra o pai. Um conto cruel e profundo, que lembra, de forma hábil e delicada, o quanto de crueldade pode haver na infância aparentemente inocente.

A infância é igualmente retratada em A canção e a sombra. Desta vez, quem narra a história é um garoto amável e reflexivo, que faz uma viagem com os pais ao sítio da avó e conhece sua “tia louca”. Esta, trancafiada pela família, esconde um segredo “imoral”. A narrativa flui com leveza, em meio a metáforas singelas – como o mulungo, que parece um forte candidato a representar a inocência – e descrições precisas, que podem deixar qualquer leitor mais conservador de queixos caídos.
Em meio ao vai e vem do Diabolô, a coletânea de contos não se resume apenas às travessuras ou maldades dos pequenos. A velhice é também protagonista na obra de Nilton. Em Não é tempo de maçãs, o narrador descreve com entusiasmo os caminhos percorridos por uma senhora que, animada com o casamento do filho, decide comprar um vestido para a ocasião e, a partir de um fato ocorrido na loja, nutre um desejo de vingança. A narrativa, com toda sua densidade, traz a bruxa dos contos de fadas para os tempos modernos, onde o desejo de tirar a vida de alguém está atribuído às condições psicológicas da personagem e não apenas ao impulso cruel da maldade pela maldade, pura e vazia.
Muito bem arquitetadas, as histórias de Diabolô transitam sem esbarrar em clichês e levam o leitor a conhecer os segredos, obsessões e frenesis humanos que são revelados por Nilton com a habilidade de quem tem uma imensa bagagem literária e utiliza de recursos linguísticos com muita naturalidade.
Contemplado pelo Prêmio Lego de Literatura na categoria contos, Diabolô foi lançado em 2011 com projeto gráfico realizado pela Núcleo Zero e capa criada por Weber Salles Bagetti. Instituído em 2007 pela Universidade Federal de Alagoas, o prêmio já conta com sete livros e tem como finalidade promover e divulgar a produção literária alagoana, além de incentivar a leitura e viabilizar o acesso a obras de escritores locais (confira na revista Graciliano nº 12 uma reportagem especial sobre os vencedores do Prêmio Lego de Literatura).
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Texto originalmente publicado aqui.